Caso de vida ⇝

A Sandra é mais um rosto da viuvez precoce. A Sandra ficou viúva aos 33 anos. Com dois filhos. Tal como muitas mulheres que perdem os seus maridos, ela também perdeu a alegria de viver. Aquele brilho no olhar. Aquele objetivo de vida. "Aguentou-se" porque tem dois filhos que precisavam {e precisam} dela. 

Agora que ambos já estão crescidos, ela deparou-se com uma vida despojada de interesse, de alegria, de felicidade. Já se passaram 12 anos. E a Sandra continua a vestir-se preto. Engordou. Não gosta da sua imagem. Continua presa ao passado.

Não consigo ficar indiferente a esta história. Não consegui conter as lágrimas ao ouvir cada palavra dita por essa mulher. 

Tal como ela, também perdi aquele brilho perante a vida. Também "aguento-me" pelo meu filho. Também engordei. Também lido mal com as cores que visto. Também vivo muito presa ao passado.

No caso da Sandra foram 12 anos nessa escuridão. 12 anos!

A Sandra confessou que, durante 5 anos, esperou que o marido voltasse. Confesso que, durante muito tempo, também pensei assim. Também esperava que voltasse. Guardei as roupas deles, os sapatos... porque caso voltasse, iria precisar! Tinha a sensação de ouvir a chave a rodar na porta. Tinha a impressão de o ver chegar na moto. 

Cada vez mais acredito que, só mesmo quem passa por uma experiência tão dolorosa como esta consegue perceber a dimensão da nossa dor, da ausência que sentimos, do vazio em casa e na nossa vida. 

O caso da Sandra é importante ser visto e compreendido, porque abrange muitas áreas associadas ao luto - a auto-estima, a solidão, o desânimo, o "aguentar-se" pelos outros, o deixar-se influenciar por terceiros, o não achar-se merecedora de ser feliz, a fome emocional... 

Cada um lida com a dor de forma diferente é certo e sabido. Reage às adversidades com maior ou menor grau de resiliência, na medida em que muita coisa influencia a nossa forma de encarar a vida e as rasteiras da mesma. 

No entanto, vi no olhar da Sandra uma vontade de sair desse "buraco", um desejo de ser feliz, mas ao mesmo tempo, uma impotência tremenda para o fazer. Foram muitos anos. Demasiados. É difícil mudar todo um padrão mecanizado de sobrevivência. É difícil, mudar mentalidades. Acredito que as mentalidades mais retrógradas também não a tenham ajudado a avançar na vida. É difícil destruirmos barreiras culturais. É difícil, mas não impossível. Requer um esforço adicional. Uma força interior que nos permita sair da nossa zona de conforto.

A Sandra {como todas as "Sandras" deste mundo} precisa de alguém que a ajude de verdade. Que acredite nela. Que não emita juízos de valores sobre os seus comportamentos. Que a apoie incondicionalmente. 

O luto é dos processos mais complicados e difíceis pelo qual o ser humano passa. É dilacerante.

O luto precisa de pessoas-luz para que os enlutados possam sair da escuridão em que mergulharam e possam acreditar que é possível voltar a ser felizes

Para a Sandra, que provavelmente não lerá este post, 
mas para ela para todas as "Sandras", um forte abraço. 
Estamos juntas!

Entrevista aqui 

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Parabéns sobrinho traquina!

14 anos de blog 💛

3 anos de casamento...